Carlos Ribas
“Continuaremos trilhando um caminho luminoso iniciado em 1946 pelo reitor Edgard Santos, em nome da UFBA, que tenho agora a honra de representar como seu primeiro e mais humilde servidor, seu mais zeloso gestor, seu mais dedicado defensor, ao longo dos próximos quatro anos.” Foi esse o compromisso assumido pelo professor Paulo César Miguez de Oliveira, durante seu discurso na cerimônia de posse como novo reitor da Universidade Federal da Bahia (UFBA), no dia 05 de setembro, no Salão Nobre da Reitoria.
O Salão Nobre ficou lotado com as presenças de representantes da comunidade acadêmica, como ex-reitores, diretores de unidades universitárias, professores, estudantes, servidores e seus representantes de classe, além de autoridades civis, jurídicas e militares. O novo reitor recebeu a borla reitoral – objeto que simboliza a autoridade do gestor máximo da Universidade – do ex-reitor João Carlos Salles. O reitor empossou também o novo vice-reitor, professor Penildon Silva Filho que, na gestão anterior, ocupou o cargo de pró-reitor de Ensino de Graduação.
Como já se tornou costume na UFBA, a cerimônia contou com apresentações musicas: Grupo Rum Alagbê, Mario Ulloa, Luã Almeida, Ana Albuquerque e Lucas de Gal, além do Madrigal e da Orquestra Sinfônica da UFBA. Antes do início da cerimônia, o Grupo de Dança Contemporânea (GDC) da UFBA apresentou uma performance em frente e no interior da Reitoria.
>>> Leia, na íntegra, os discursos do reitor Paulo Miguez, do ex-reitor João Carlos Salles e do vice-reitor Penildon Silva Filho.
>>> Acesse o registro fotográfico do evento, realizado pela fotógrafa Lia Sfoggia.
Ouvido da comunidade
Miguez lembrou que “tão grande quanto a honra de ser reitor, é a responsabilidade de ser, por quatro anos, o principal ouvido de uma comunidade de mais de 60 mil pessoas entre estudantes, professores, técnicos, terceirizados das mais diversas áreas, portadores das mais variadas necessidades, anseios e aspirações”.
“Ser reitor é, sem dúvida, uma dádiva concedida pela comunidade universitária. Uma dádiva, contudo, que carrega uma enorme e desafiadora missão: conduzir e representar uma instituição que encarna a principal aposta de nossa sociedade em um futuro de saber e liberdade, pleno de ciência, cultura e arte. Pleno de vida”, afirmou o reitor.
“Mas atenção”, pontuou Miguez: “trata-se de uma dádiva que expressa uma vontade, a vontade da comunidade universitária. E aqui é preciso reafirmar, agora e sempre, que deve ser dela, desta vontade da comunidade universitária, desta vontade soberana e somente dela, o direito de escolher a pessoa que, por quatro anos, será seu primeiro servidor”.
Paulo Miguez lembrava estar aceitando a tarefa de ser o 16º reitor da UFBA autorizado pelos 10.172 votos recebidos da comunidade universitária por ele e pelo professor Penildon Silva Filho, e pela chancela do Colégio Eleitoral que indicou os nomes em primeiro lugar de suas listas tríplices com a maioria de votos.
E depois de traçar uma linha do tempo recordando sua trajetória desde quando era estudante do Colégio Maristas até aquela solenidade de posse, Miguel afirmou: “A partir de agora, um novo desafio, este novo reitorado. Seja qual for o quadro político-econômico em que se encontre o país a partir do próximo ano, a UFBA seguirá enfrentando com altivez os grandes desafios de seu tempo. Em cenário de escassez ou de bonança de investimentos federais, a política de gestão responsável da coisa pública, lastreada por um planejamento racional e audacioso e sempre em busca da maior eficiência em aquisições e contratações de obras e serviços, bem como da plena execução orçamentária anual, continuará sendo o alicerce da administração da UFBA nos próximos quatro anos.”
Falando em inclusão social, Miguez lembrou que neste ano as cotas completam 18 anos de implantação na UFBA. “Nada mais condizente com o pioneirismo de nossa Universidade nesse campo, portanto, do que iniciar um novo reitorado reafirmando a defesa intransigente das ações afirmativas, que devem ser não somente mantidas como continuamente ampliadas, sendo esse um compromisso fundamental da gestão que se inicia, como foi nos oito anos da gestão anterior. Serão continuadas, com ampliação de seu alcance, as ações de incentivo à permanência dos estudantes em situação de vulnerabilidade socioeconômica – registro que considero que a permanência é o grande desafio da universidade pública hoje, bem como terão seguimento as políticas de garantia do efetivo preenchimento das vagas reservadas aos setores sociais e grupos identitários historicamente desfavorecidos”, garantiu.
Miguez assumiu ainda outros compromissos, como a implementação da curricularização da extensão, aprovada recentemente pelo Conselho de Ensino, Pesquisa e Extensão; a busca por ampliação dos indicadores de desempenho e qualidade do ensino, consolidando o progressivo avanço registrado ao longo dos últimos oito anos; e a continuidade das bem sucedidas políticas de internacionalização e de avanço isonômico da qualidade da pesquisa e da pós-graduação – inclusive antecipando à comunidade o sucesso obtido pela UFBA na mais recente Avaliação Quadrienal da Capes, ainda não divulgada amplamente.
Na área administrativa, apesar da reconhecida retração orçamentária que a UFBA enfrenta, seguirá enfrentando os problemas relacionados à segurança dentro e no entorno dos campi. “Adversidades orçamentárias tampouco farão a Administração Central descuidar da manutenção preventiva e corretiva de seus 187 prédios, estacionamentos, vias de acesso e áreas verdes, como já vem ocorrendo. A diretriz de priorizar o término de obras já iniciadas – que na gestão anterior resultou em mais de 75% de conclusão das construções encontradas inacabadas no início do mandato – será, sem qualquer dúvida, mantida”, afirmou o reitor
Na área de gestão de pessoas, a Administração Central segue comprometida com a implementação dos turnos contínuos, bem como com a discussão responsável acerca das novas modalidades de realização do trabalho técnico-administrativo, desde que dentro do marco fundamental da Universidade: sua natureza essencialmente presencial, “algo fundamental, seja para o restabelecimento da saúde da comunidade, abalada pelo isolamento no período da pandemia, seja para a defesa do patrimônio da instituição, que, se esvaziado, torna-se mais vulnerável, inclusive, ao escuso assédio da especulação imobiliária”.
“Amanhã vai ser outro dia”
E nesse novo amanhã, “qual deve ser o nosso ideal coletivo?” pergunta o novo reitor, para responder em seguida: “Permitam-me, aqui, reafirmar o bordão do manifesto de nossa campanha à reitoria: a aposta no ensino, pesquisa e extensão de qualidade, de forma pública e gratuita, com gestão transparente e cuidadosa, inclusão social e combate continuado a todo tipo de desigualdade.”
E assume: “Continuaremos trilhando um caminho luminoso iniciado em 1946 pelo reitor Edgard Santos É o nome da UFBA que tenho agora a honra de representar, como seu primeiro e mais humilde servidor, seu mais zeloso gestor, seu mais dedicado defensor, ao longo dos próximos quatro anos.”, encerra Miguez, sendo bastante aplaudido.
“Caminhar é interromper quedas sucessivas”
Antes de transmitir o cargo ao novo reitor, o ex-reitor João Carlos Salles (2014-22) lembrou momentos de dificuldades do seu mandato, como os cortes de verbas e a pandemia, que não impediram a gestão de realizações notáveis. “A Universidade pública brasileira amarga hoje os efeitos de um ataque sem igual. Porém, em meio à adversidade, conseguimos preservar e proteger o padrão elevado de qualidade acadêmica com a garantia de nossas atividades de ensino, pesquisa e extensão”, disse.
“Caminhar é interromper quedas sucessivas”, disse Salles, afirmando que a descrição, “bela por ser literal”, não exclui outra leitura: “Com efeito durante oito anos, não houve um minuto sequer de trégua. A hostilidade, restrições orçamentárias, o golpe do impeachment, condução coercitiva de reitores e, no atual governo, ataques, diretos à vida universitária e a ciência, pandemônio, rudeza, falta de compostura, pandemia, cortes...”, lembrou.
“Não obstante tudo isso fomos UFBA em movimento e seguimos juntos e misturados. Sofremos ameaças, corremos riscos, tivemos danos, mas nunca paramos. Sempre demos os passos necessários e vivemos por nossa UFBA na mais intensa alegria”, disse, emocionado.
João Carlos Salles disse também que a gestão que há poucos dias terminava, não se furtou ao embate político, à defesa intransigente da universidade pública e de seus valores, e com a mobilização e unidade da comunidade universitária procurou-se proteger a áurea da universidade pública por meio de valores de uma excelência acadêmica ligada ao compromisso social da instituição.
Declarou ainda que foi com intensa alegria que a UFBA fez sete congressos abrigou o fórum social mundial, a bienal de cultura da UNE, realizou encontros, seminários, atos acadêmicos e atos políticos, aprofundou ações afirmativas, inclusive com concursos docentes, além de criar novas unidades e inaugurar prédios.
“E, ainda, diante do desafio da grave emergência sanitária em nosso país, da pandemia provocada pela Covid, soubemos dizer sim à vida, sem hesitação; soubemos afirmar os valores da educação e combater a barbárie; soubemos resistir, em suma, a todas as formas de obscurantismo e autoritarismo. (...) Também soubemos reagir a todas as investidas publicas ou de bastidores, contra nossos valores ou nosso patrimônio. Desse modo a UFBA teve papel destacado na luta contra o Future-se e outras investidas contrárias a valores inegociáveis. Nosso caminho foi, e sei que sempre será, o da afirmação de um projeto de longa duração da defesa deste lugar de ciência, cultura e arte, sem qualquer rendição de quem deseje agredir nossa autonomia.”.
“Andar é recuperar quedas sucessivas, e nunca deixamos de caminhar. Nunca deixamos de resistir, tendo por horizonte uma sociedade não mais desigual, uma sociedade capaz de superar sua chaga de exclusão e autoritarismo, sendo profunda e radicalmente democrática. Dessa matéria e dessa energia, Miguez e Penildon, brotou sua gestão. Esse é o legado de cuja construção coletiva vocês fizeram parte, sendo, pois, ainda mais responsáveis por guardar esses valores, com os quais a UFBA continuará sua caminhada e decerto vencerá”, afirmou o agora ex-reitor.
Lembrando Anísio e Darcy
Para o vice-reitor Penildon Silva Filho, a universidade provavelmente é a instituição criada pela humanidade mais engajada nos processos de avanço civilizatório, democrático, social, econômico e cultural. “É uma instituição complexa, que por sua natureza ultrapassa os indivíduos que a compõem para continuamente recriar uma utopia de civilização humana, internacionalizada, que não reconhece fronteiras.”
“Uma instituição que nos dizeres de Anísio Teixeira e Darcy Ribeiro – prossegue Penildon – se caracteriza pela autonomia de pensamento, de cátedra, de pesquisa, pela liberdade de questionar e ao mesmo tempo pelo profundo compromisso social, pela construção de uma soberania nacional. Soberania esta que apenas pode ser alcançada pela soberania cientifica tecnológica, pela soberania cultural, pela superação dos grandes problemas nacionais, como Anísio e Darcy disseram, problemas como a fome, a miséria, a desigualdade e exclusão.”
E acrescentou que “a esses desafios, elencados pelos criadores da Universidade de Brasília, se somam outros desafios, lembra ainda o novo vice reitor, “que se tornaram mais evidentes e urgentes, como a sustentabilidade ambiental, e a desconstrução do mito da democracia racial, e o esforço pra construir um país que supere a herança escravista do racismo estrutural.”
Finalizando, Penildon afirmou que será um privilégio poder contribuir com a gestão professor Miguez, “especialmente no momento de necessidade de firmação dos valores da democracia, da adversidade, da justiça social, da sustentabilidade ambiental, da sociedade brasileira”.