A Olimpíada Brasileira de Física nas Escolas Públicas (OBFEP), importante evento nacional de divulgação e iniciação científica que nos últimos cinco anos alcançou aproximadamente 3,2 milhões de crianças e adolescentes de cerca de 3 mil escolas públicas, só acontecerá em 2017, se conseguir levantar recursos nas próximas semanas.
Idealizada em 2009 e desde 2012 realizada a cada ano em escala nacional, a Olimpíada aguarda resposta de sua até aqui única fonte financiadora, o Ministério da Ciência, Tecnologia, Inovação e Comunicações (MCTIC), a um pedido emergencial de R$ 300 mil. Mesmo se for atendido, esse recurso só cobrirá perto da metade do orçamento de R$ 720 mil inicialmente previsto, e já não acolhido pelo ministério.
Em razão disso, os organizadores da OBFEB buscam o apoio de outras instituições públicas que possam contribuir para bancar a importante iniciativa – entre elas, as universidades federais e estaduais baianas.Nesse sentido, o coordenador nacional da Olimpíada, José David Mangueira Viana, professor visitante titular no Instituto de Física da UFBA, e a coordenadora estadual do evento, professora Maria das Graças Martins, também titular no mesmo Instituto, estiveram nesta semana com o reitor João Carlos Salles, que se comprometeu a levar a questão à Associação Nacional dos Dirigentes das Instituições Federais de Ensino Superior (Andifes) e a mobilizar os reitores para assegurar a realização da Olimpíada.
Realizada pela Sociedade Brasileira de Física (SBF), a OBFEP é uma competição entre jovens de escolas públicas, entre o 9º ano do fundamental e o 3º ano do ensino médio, em que o que está em jogo não é simplesmente ganhar ou perder. A olimpíada vem sendo uma daquelas escassas oportunidades que a rede pública de ensino básico oferece aos estudantes, fora dos limites da sala de aula, de despertar para o conhecimento científico, desenvolver o raciocínio abstrato e experimental, entrar em contato com colegas de outras escolas e conhecer outras instituições de ensino e até mesmo universidades.
Em 2012, primeiro ano em que a competição foi realizada nacionalmente, 1,2 milhão de alunos participaram. A partir de 2013, o máximo de inscrições foi limitado a 500 mil por ano. No ano passado, a olimpíada custou ao MCTIC aproximadamente R$ 600 mil. “É um projeto vitorioso. Se você fizer a conta, estamos falando em um gasto de R$ 1,20 por aluno, que gera resultados e legado enormes”, resume José David, originário da Universidade de Brasília (UnB) e seu professor emérito.
A olimpíada é coordenada localmente por docentes de universidades ou institutos federais, que trabalham voluntariamente no projeto. A quase totalidade dos recursos é empregada na elaboração e transporte das provas, na confecção de kits para realização da fase experimental dos exames, na produção de eventos de premiação, medalhas, troféus e camisetas, na edição de livros de questões atualizadas, respondidas e comentadas, e também na divulgação do evento, por meio de sites, redes sociais e cartazes. Há ainda a promoção de concursos de desenhos entre os inscritos, tendo sempre o universo da física como tema.
Além de motivar estudantes e professores e formar uma rede nacional em torno da física, a olimpíada também deixa como legado o incremento de laboratórios e bibliotecas nas escolas, já que, anualmente, todo o material enviado para a realização das provas – algo entre 10 e 20 mil kits de experimentos físicos (que podem conter multímetros, polias, aferidores de fenômenos óticos etc.) e os livros de questões atualizadas – torna-se propriedade das unidades de ensino. “E se precisarem de kits e livros a mais para suas escolas, os professores podem solicitar”, diz o professor José David.
Coordenadora na Bahia, a professora Maria das Graças Martins está preocupada diante do risco iminente de não realização da competição neste ano. Ela explica que, ao longo dos últimos anos, a Olimpíada cresceu, não apenas no tamanho, como na robustez da rede de professores e instituições participantes e parceiras. “Acabar com tudo isso será algo muito grave. Se tudo o que foi construído for desativado, retomar depois será muito complicado.”
Realizar a OBFEP com menos da metade do orçamento previsto significará reduzir a quantidade de locais de realização de provas, restringir o envio de provas impressas e, certamente, deixar de alcançar zonas rurais e ribeirinhas de difícil acesso. “Ainda que seja preciso reduzir, não podemos deixar morrer”, avalia a professora Graça. Entre os casos mais emblemáticos que demonstram a importância do evento, ela lembra o caso do Colégio Estadual de Tanque Novo, no pequeno município de 17 mil habitantes, a mais de 700 km de Salvador, que registra um dos melhores desempenhos nos últimos quatro anos seguidos; e o de uma estudante que foi medalha de ouro também por quatro anos seguidos e que, atualmente, é aluna da graduação em física da UFBA.
Os melhores alunos das olimpíadas são convidados a integrar projetos de pesquisa de iniciação científica, em conjunto com seus respectivos professores de física e docentes universitários, com bolsa Pibic-EM (Programa Institucional de Bolsas de Iniciação Científica para o Ensino Médio). Para os mais bem colocados, a OBFEP significa também uma oportunidade de projeção internacional: os 40 mais bem classificados do país são convocados para receber preparação específica e integrar as equipes brasileiras que disputam dois eventos: a IPhO (International Physics Olympiad) e a OIbF (Olimpíada Ibero-americana de Física). “No início dos anos 2000, os maiores medalhistas da OibF eram Cuba e Espanha. Hoje, o Brasil é o país com mais medalhas”, afirma a professora Graça.
A situação que a Olimpíada enfrenta neste ano é semelhante à de outras olimpíadas de divulgação científica. A Olimpíada de Matemática para as Escolas Públicas foi incorporada à Olimpíada Brasileira de Matemática, que engloba escolas públicas e privadas – situação em que a competição entre os alunos tende a ser evidentemente desigual, com menos chances de destaque para os estudantes das públicas. E mesmo olimpíadas que normalmente já envolvem tanto a redes pública quanto a privada, como as de Química, Física e Biologia, sofreram cortes significativos em seus orçamentos e passaram a ter que disputar verbas via editais, explica o professor José David.
Fonte: Edgardigital