“Pensar o futuro exige abordar uma gama de temas relacionados ao momento atual, marcado por novas tecnologias que afetam as relações de trabalho e causam impactos como o desemprego e a substituição dos trabalhadores por máquinas”, disse o professor da Universidade de Campinas (Unicamp), Anselmo Luis dos Santos, durante o debate sobre a quarta revolução industrial e a precarização do trabalho, realizada na manhã de quarta-feira, 18, no Pavilhão de Aulas Felipe Serpa – PAF 1, no campus de Ondina.
A atividade preparatória para o Fórum Social Mundial (FSM) integra a programação do Congresso de Pesquisa, Ensino e Extensão da UFBA, que sediará o evento internacional em março do próximo ano. Em sua participação, o professor abordou as expectativas de futuro diante da quarta revolução industrial e das incertezas com as transformações em curso que promovem a precarização do trabalho. Anselmo Santos apontou que esse processo de se verifica desde a década de 1970 e é próprio do modelo de produção capitalista, caracterizado pela venda da força de trabalho e pelo individualismo.
Diante da atual revolução tecnológica e das comunicações, com o avanço da robótica e da internet das coisas, ele questionou "Haverá emprego para todo mundo? Haverá vínculo empregatício?”. E apontou o enfraquecimento de instituições importantes para regulamentar as relações de trabalho e combater a exploração do trabalhador e os casos análogos à escravidão. Ao falar sobre o futuro das relações de trabalho, ressaltou que é preciso considerar um conjunto de políticas sociais, a exemplo do seguro desemprego. E revelou a sua preocupação com o rumo das relações trabalhistas e a possibilidade de desemprego e pobreza em massa no mundo.
O professor avalia que a tecnologia é muito algo positivo, podendo contribuir para a produção de riquezas e assegurar melhores condições de vida para a humanidade. No entanto, constata a concentração do desenvolvimento tecnológico nos países ricos. "O Brasil infelizmente se encontra extremamente atrasado do ponto de vista da próxima revolução industrial", disse.
Para ele, a tecnologia não decide nada por si mesmo, quem decidirá de que forma as tecnologias serão incorporadas são as pessoas, as organizações sociais e as relações de poder. "Que a produção sirva para o desenvolvimento humano e não apenas para o acúmulo de riquezas na mão de poucos", conclamou.
Nivaldo Santana, secretário de relações internacionais da Central de Trabalhadores e Trabalhadoras do Brasil (CTB), destacou a construção do movimento sindical diante das revoluções industriais e no combate à exploração dos trabalhadores. Em relação à quarta revolução em curso, considera que "estamos vivendo um tsunami na forma de produção", e apontou os impactos disso nos setores da indústria e de serviços.
Ele criticou a redução do orçamento para ciência e tecnologia no país, que tem gerado a evasão de grandes talentos para o exterior, e afirmou que é necessário investir na área para a produção de riquezas e construção de uma sociedade mais justa. "O Brasil está enfrentando uma situação de colapso no seu sistema de produção científica e tecnológica. O país que perder o passo nessa revolução industrial, que não for vanguarda, ficará para trás".
"Não queremos combater as inovações tecnológicas. A grande questão é como compartilhar os avanços para o desenvolvimento social", disse Nivaldo Santana, que considera que o modo de produção capitalista não tem a capacidade de promover a distribuição de riquezas em razão da sua própria lógica, com a divisão desigual dos frutos do trabalho. Ele acredita que as inovações científicas trazem condições para as pessoas trabalharem menos e usufruir outras possibilidades da existência humana com o tempo livre. E apontou a necessidade de redução da jornada de trabalho e ampliação da rede de proteção ao trabalhador. Por fim, disse que uma realidade em que existem milhões de pessoas sem emprego poderá resultar no caos social.
O marroquino Abdelkader Zraih, representante do FSM, avalia que o mercado de trabalho atual é bastante complexo devido às profundas transformações por que passa o mundo. Em sua fala, compartilhou a crise por que também passa o seu país, com a falta de empregos, sobretudo para os jovens. Também criticou a atuação de empresas multinacionais, a terceirização e a flexibilização das relações de trabalho. Ele aponta que o mundo hoje se caracteriza pelo crescimento do poder das corporações internacionais, que procuram mão de obra barata e retirar a maior produtividade possível nas horas trabalhadas. Zraih convocou o público pressente para participar do Fórum Social Mundial em 2018: "É nossa responsabilidade salvaguardar o espaço do FSM como lugar de debates e produção de saberes e comunicação alternativa, de forma a ajudar na luta contra a precariedade das relações de trabalho", finalizou.
A secretária de Mulheres da Central Única dos Trabalhadores da Bahia (CUTBahia), Lucíola Simião destacou a participação das mulheres no movimento social e na luta por espaços de poder como as universidades e o mercado de trabalho. Criticou as diferenças salariais entre homens e mulheres que desempenham o mesmo trabalho e a falta de presença feminina nos principais postos, inclusive no próprio movimento sindical. Lucíola lembrou a contribuição das mulheres que têm ido às ruas contra os retrocessos e ocupado também espaços como associações de bairros, escolas, postos de saúde "O espaço é de todos nós. Queremos trabalhar juntos, assim venceremos".
Inalba Fontenelle, secretária de Formação da CTB, também reafirmou a luta das mulheres para sair do mundo privado e demonstrar as suas competências no mundo do trabalho. Os avanços conquistados por meio dos movimentos organizados de mulheres foram apontados como essenciais para a emancipação da sociedade. Ela questionou o papel que as mulheres assumirão diante das transformações provocadas pela indústria 4.0, reivindicando igualdade entre os sexos. "Não precisamos que os homens venham nos treinar e dizer como devemos falar ou nos portar", disse, para ressaltar a importância de as mulheres de auto-afirmarem e conquistarem a independência através do trabalho.
"Não é apenas ter trabalho. Mas que trabalho é esse?", questionou Inalba Fontenelle, citando os inúmeros casos de assédio moral e sexual que as mulheres sofrem no ambiente de trabalho. Em seguida, o debate foi aberto ao público, quando foi duramente criticada a recente medida adotada pelo governo federal no sentido de dificultar a fiscalização do trabalho escravo no país.